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“RACISMO AMBIENTAL E CRIMINALIDADE – DESAFIOS À DEMOCRACIA”
Ano 6 - Nº 24
Abril de 2011
Publicação Virtual de KOINONIA (ISSN 1981-1810)
_Página de KOINONIA
 
Para humanizar a Vida

O conjunto de textos que conformam esta edição de “Tempo & Presença” e, particularmente, o referido ao “Mapa da Desigualdade” nos revela um país econômica e socialmente injusto e multi-partido, com sua população segmentada em nichos variados que revelam as marcas do racismo, da subordinação, da marginalização e da discriminação. Um país desumano onde uma ínfima minoria detém a maior parte da riqueza por todos produzida. Em cerca de meio século nos transformamos de um país com população essencialmente rural num país caracteristicamente urbano, com cerca de 80% da população vivendo em grandes conglomerados metropolitanos. Este fato, que não resultou na transformação das formas de propriedade rural, gerou um quadro espantoso de cidades populacionalmente “inchadas”, com mais habitantes do que, tanto a sua infra-estrutura física como sócio-econômica, é capaz de suportar.

Esta expansão caótica e desgovernada, ao longo das últimas décadas, dos centros urbanos, trouxe consigo um complexo de problemas de ordem econômica, social, política e cultural que os tem transformado em subunidades populacionais quase que ingovernáveis. Ao mesmo tempo deixou intocáveis e, em alguns casos os agravou, os problemas relativos à sobrevivência no campo. A violência e a insegurança tanto física dos cidadãos comuns como sócio-econômica da grande maioria, em que pesem os milhões de novos empregos propiciados pelo governo do presidente Lula, tornaram-se a marca característica dessas monumentais ilhas populacionais em que nosso povo hoje se distribui.
Frente a esta nova configuração de nossa sociedade, com o processo permanente e ininterrupto de construção de novos mitos e fabulações, impactantes e efêmeros graças ao concurso dos fabulosos recursos midiáticos de que dispomos, quando tudo é transformado em mercadorias de rápido e ‘imprescindível’ consumo, em função do imperialismo do dinheiro, signo maior do poder, que compromissos e tarefas devem caracterizar a comunidade daqueles e daquelas sensibilizados pelo modus vivendi inaugurado por Jesusde Nazaré?

É em meio a esta trama complexa de comunidades de ávidos consumidores de bens materiais e espirituais, de identidades diversificadas, mas todas definidas pelo Monoteísmo do Mercado, esse novo Moloch ou, talvez, o novo nome do Anticristo, que a comunidade cristã tem que redesenhar os traços de seu rosto. Mas não apenas ela. Num tempo de afirmação valorizadora das diversidades, de compreensão e reconhecimento dos limites das propostas humanas, de busca do diálogo como único caminho para a afirmação da humanidade do homem e da mulher, as demais comunidades religiosas também são instadas a reler suas tradições mais profundas e delas resgatar aqueles elementos perenes que promovem a vida e tornam profundamente humanas as relações entre os filhos e filhas do Criador.

Aqui algumas questões pedem respostas urgentes: se a presente globalização, tal como é imposta a todos, com todo o seu rosário de injustiças, exploração e marginalização das maiorias, não é uma mera homogeneização, como a parafernália midiática nos quer fazer crer, mas um processo de fracionamento e recomposição continuada das comunidades humanas, ao sabor dos desencontrados e mesquinhos interesses do Mercado, como devem as comunidades religiosas entender seu lugar e papel neste permanente processo de mutação socioeconômica e cultural?

No caso do Cristianismo aprendemos que o testemunho de vida de Jesus inspirou a criação de uma comunidade de iguais, onde todos devem ser responsáveis por cada um e cada um deve entender-se como responsável por todos. Uma comunidade de pessoas misericordiosas e compassivas. Entendemos que o Espírito de Deus, de tantos nomes e diferentes compreensões, que preserva e sustenta a vida, está nos convidando hoje a recuperar o aspecto simbólico-sacramental da existência comunitária, oferecendo ao mundo um testemunho profundo e convincente de um novo estilo de vida de uma comunidade que vive da esperança de um novo tempo. Para os cristãos isto significa que uma nova ordem de vida entre os humanos é possível porque Jesus de Nazaré morreu, como muitos outros(as) depois dele, cravando no horizonte da humanidade o sinal da cruz e que ressuscita cada vez que os humanos reconhecem os limites de sua precariedade histórica e se reconhecem iguais diante do Mistério prodigioso que preside a vida.
A comunidade cristã, assim como as demais comunidades religiosas, irmanadas na promoção e defesa do humano, como espaços para uma prática intensa de solidariedade e comunhão, que reúnem os humanos num único projeto fundamental de vida compartilhada, tem nesta proposta a sua contribuição essencial para a construção de uma cidadania responsável numa sociedade verdadeiramente igualitária.