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DESASTRES SÓCIO-AMBIENTAIS E A LUTA PELA JUSTIÇA ECOLÓGICA
Ano 5 - Nº 21
Outubro de 2010
Publicação Virtual de KOINONIA (ISSN 1981-1810)
_Artigo
 
Carta do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social

Vivemos um momento da história da humanidade em que está em risco o futuro das mais diversas formas de vida no planeta terra, inclusive do ser humano. A conjugação simultânea das crises atuais e, especialmente a questão ecológica, tem desencadeado tragédias de enormes proporções, o que impõe a urgente adoção de medidas que envolvam a todos.
Preocupa-nos profundamente o impacto desproporcional que as mudanças climáticas, provocadas pela ação do ser humano no planeta, têm causado nas populações mais pobres e vulneráveis que vivem permanentemente em áreas e situações de risco.
Estas pessoas que vivem em situações de pobreza têm mostrado grande capacidade de resistência e de sobrevivência diante do impacto das mudanças do clima sobre suas vidas e seu sustento. No entanto, estão chegando rapidamente a um limite, a partir do qual já não mais poderão sequer adaptar-se a novas formas de vida.
Não bastasse o fato de que as mudanças climáticas afetam a vida do planeta como um todo, os que menos contribuíram para que chegássemos a tal situação são os que mais sofrem suas consequências. Os refugiados pelas alterações climáticas já somam a 45 milhões de pessoas.
Neste sentido, por um lado é crucial que enfrentemos o debate sobre as alterações climáticas numa perspectiva de desenvolvimento, porém, centrada nas pessoas, em seus direitos, respeitando e promovendo a equidade e a justiça social. Por outro lado, para se alcançar uma justiça eficaz, as indústrias poluidoras devem pagar pelos seus atos e os principais responsáveis pelo aumento das temperaturas mundiais devem assumir as suas responsabilidades para enfrentar essa ameaça global.
Para o Brasil, o maior desafio é continuar o desenvolvimento sem aumentar a emissão de gases de efeito estufa e incluir socialmente grandes segmentos da população sem aumentar a crise do clima. Coloca-se aí o maior dos impasses: o debate sobre a construção de outro paradigma de desenvolvimento que seja efetivamente justo, sustentável e responsável com a natureza e com as futuras gerações.
Fazer este debate significa, de um lado, ampliar e qualificar a discussão sobre tecnologias e matriz energética realmente limpa; significa também buscar uma economia de baixa emissão de gases de efeito estufa, e uma nova racionalidade para o consumo humano, bem como garantir a seguridade e soberania alimentar e os demais direitos sociais das populações e povos.
Por outro lado, faz-se necessário a criação de um mecanismo de governança mundial equitativo e transparente que represente os países pobres e em desenvolvimento e que faça a gestão e o controle dos fundos para mudanças climáticas. Faz-se necessário construir mecanismos que contribuam para um modelo de desenvolvimento que tenha como base a agroecologia, uma matriz energética diversificada e descentralizada e o reconhecimento e valorização das práticas tradicionais baseadas na convivência entre produção e preservação ambiental. Faz-se necessário promover a sustentabilidade e dignidade do desenvolvimento humano, especialmente das populações mais vulneráveis, e a integridade dos processos ecológicos, mediante a transformação da economia e o fortalecimento da democracia.
Diante da gravidade das mudanças climáticas, este Fórum propõe:
a- Ampliar o conhecimento e monitorar os impactos sociais e ambientais das mudanças climáticas e do aquecimento global, averiguar suas causas e suas consequências, tendo prioritariamente como referência a sabedoria dos povos tradicionais e a opinião das pessoas que já passam por situações graves relacionadas ao assunto, bem como os estudos de cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC).
b- Desenvolver ações conjuntas e abrangentes, para enfrentar os problemas decorrentes do aquecimento e encontrar alternativas de adaptação para as populações, especialmente as mais pobres que são as mais violentamente atingidas.
c- Opor-se radicalmente ao projeto de construção da usina de Belo Monte, no Estado do Pará, considerando ser este empreendimento altamente depredador da natureza e das populações locais.
d- Reafirmar nossa corresponsabilidade em relação ao cuidado com a integridade da criação, obra divina, como imperativo da fé cristã.
Na solidariedade com a Terra crucificada em sua desafiante paixão, na certeza da força da páscoa da ressurreição, reafirmamos nosso permanente compromisso em defesa da vida no planeta e do planeta terra.

Brasília - DF, 7 de abril de 2010.