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Na área rural de Cabo Frio, em um bairro chamado Angelim,
ficam localizadas as Terras de Preto Forro. Seus moradores, distribuídos
por 10 casas, somam aproximadamente 60 pessoas descendentes de antigos escravos
que trabalhavam em duas fazendas vizinhas. Contam que o nome Preto Forro
foi dado àquelas terras para marcar a diferença de outras terras ocupadas
por trabalhadores em regime de escravidão.
Há três gerações a responsabilidade com as terras Preto Forro tem permanecido
entre os homens descendentes diretos do primeiro dono e fundador da comunidade.
Uma delas era o pagamento dos impostos que era divido entre todos os moradores.
No final da década de 1980, o responsável arrendou parte das terras da comunidade
para que um fazendeiro vizinho as usasse como pasto, sob o argumento de
que assim, o grupo teria como pagar os impostos sobre a terra. Em pouco
tempo, porém, o constante endividamento pessoal desse responsável junto
ao fazendeiro, levou a que ele lhe transferisse o direito de posse das terras
como forma de pagamento, apesar de não ter direito a isso.
A partir daí o fazendeiro tem forçado o deslocamento daquelas famílias de
diferentes formas que evitam a violência direta. Suas plantações têm sido
destruídas pelo gado, eles estão sendo proibidos de ampliar seus quintais
ou construir casas para seus filhos, e a mata original, de onde eles extraíam
de forma equilibrada a madeira para a produção de carvão em pequena escala,
já foi praticamente toda destruída para a ampliação do pasto. Das poucas
árvores frutíferas que restaram, o fazendeiro já não permite que os moradores
retirem os frutos.
A comunidade, apesar de ter um dos times de futebol mais bem equipados e
organizados da Região dos Lagos, não tem uma Associação de Moradores própria,
nem seus componentes são sindicalizados. O consenso local sobre a legitimidade
de suas posses não tinha criado a necessidade de uma maior organização,
até agora.
A árvore e o mapa
Da comunidade de Preto Forro participou da Oficina apenas uma pessoa, Ademir
(33 anos). Como estava sozinho, durante a produção da "árvore da história"
ele foi absorvido pelo grupo da Caveira, por se supor uma convergência entre
suas histórias mais remotas. Mas tanto as discussões que prevaleceram naquele
grupo, quanto os limites temporais da história que Ademir está habilitado
a reconstituir frustraram essa expectativa. No momento da apresentação da
árvore, quando foi convidado para contar a história da sua comunidade, ele
concentrou-se justamente nos acontecimentos da última década, a partir de
quando a posse pacífica das Terras de Preto Forro foi posta em perigo.
Uma maior participação ficou por conta da construção de seu mapa, quando
pudemos recuperar mais detalhadamente as dimensões daquelas terras e o impacto
da entrada do fazendeiro, tanto na destruição das reservas de mata nativa,
quanto nos efeitos da presença do gado. As famílias locais passaram a cercar
suas posses familiares, quando antes o que existia era uma única terra de
uso comum que era ocupada de acordo com as necessidades e capacidades familiares
a cada novo ano.
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“Meu objetivo é sair daqui com alguma notícia,
alguma coisa para passar pro pessoal lá, o que aconteceu o que não aconteceu,
por que eles não puderam vir. Fico muito feliz de estar aqui com vocês,
porque aqui a gente esta aprendendo... e fica passando e vem mais gente
aqui para conhecer... e isto que é mais importante para todo mundo”. ADEMIR
– PRETO FORRO
“A gente é herdeiro da terra e tinha um primo da gente, ele tinha uma
parte que ele morava. Antes o pessoal pagava (imposto), aí ele chegou
e falou que o pessoal não precisava mais pagar porque ele tinha alugado
o pasto para um cara e o dinheiro que ele pegava, pagava. Daí passaram
uns tempos e o cara apareceu dizendo que ele era dono da terra, dizendo
que ‘eu comprei e vocês não podem fazer mais nada aí’. Mas como não pode
fazer se é da gente, por que a gente não pode fazer? Aí o pessoal lá,
os primos, o pessoal entraram e fizeram no peito. Um troço que é da gente
não vai fazer porque o cara proibiu? Tem que entrar e fazer. A gente tem
que meter bronca para frente, entrar e fazer mesmo. Ele está com o gado
dele lá. Estamos correndo atrás desse objetivo”. ADEMIR – PRETO FORRO
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